Quantos Pessoa?

Que chato escrever poesia e abordar sempre as mesmas temáticas! Quem sabe não pensou um dia nisto, Fernando Pessoa ou seus compadres. O senhor de Lisboa, com um terrível tormento – a dor provocada pelo pensamento. Tema esse que surge quase irremediavelmente nas suas composições poéticas. Mas isto de analisar os detalhes das palavras de Pessoa e denotar os motivos poéticos, é tanto genialidade dele como nossa. Dele porque intelectualizou as emoções como ninguém, e nossa porque temos a necessidade de encontrar uma regra geral, um padrão, seja ele qual for. Também isto é matemática, reunir os temas mais manifestos na poesia de Pessoa ortónimo e dos seus heterónimos. Mas nada do que acabei de dizer coloca em causa a sua genialidade. Pessoa reunia todas as bases necessárias para isso. Aluno brilhante enquanto estudou na África do Sul, sexualidade duvidosa e o facto de nunca ter obtido o devido reconhecimento em vida. Fernando Pessoa queria ser o poeta, o grande poeta português, o maior poeta da língua portuguesa. Posto isto, todos os argumentos contrários que poderei vir a alegar posteriormente serão obviamente ridículos.
Não deixa de ser bela a ideia de que sendo Pessoa, uma só – pessoa –, se desdobrasse em várias. Uma característica tão incomum para qualquer época. Incomum como o nome lhe assentar tão bem. Mas consciência disso tinha-a ele, e não haviam coincidências, que não consta que Ricardo Reis tivesse particular interesse pela dinastia Afonsina nem de Avis. E de campos? Entendia-os Caeiro só de os olhar, Álvaro não. Nem todos podem ter essa sorte, e Reis, não teve muita que até para morrer teve de esperar por uma data de Saramago. Pelo menos aceitava pacificamente o destino! Que lhe valha ao menos isso. E apesar de Ricardo Reis ter uma grande ligação à cultura clássica, e do seu autodidatismo, o interesse por várias áreas do conhecimento, destaca-se porém, em Fernando Pessoa. Curioso não deixa de ser também a ligação que cada um deles tem com o ortónimo. O que não é tão estranho assim. Porque redigiria Pessoa ditos de heterónimos que não lhe “diziam nada”? Quantas dessas vozes não foram ouvidas pela sua “quotidiania” insuportável? Permanece o mistério.