Charlie

Numa semana marcadamente sombria para a liberdade de imprensa, com a perda de cartoonistas que no fundo eram activistas pelos direitos fundamentais como é o direito à liberdade de expressão, o mundo reflecte sobre se de facto todos temos esse direito, de pensar e de nos expressarmos segundo as nossas convicções. É óbvio que não. O que existe na constituição falha redondamente na prática. Quando, na quarta-feira ecoou por todo o mundo a frase “Je Suis Charlie”, “Eu Sou O Charlie”, em português, esta estava muito mais próxima de ser apenas uma sincera homenagem e um pedido de desculpas pela nossa intolerância face a cartoons ditos exagerados do que transmitir a ideia de que todas as forças do nosso ser apoiam e enaltecem constantemente este e outros direitos fundamentais. A verdade é que usando da nossa liberdade de expressão fazemos reduzida a de um outro por considerarmos a sua – liberdade de expressão - ofensiva para alguém. Torna-se vicioso. O que há num Charlie? Não pode haver medo. Há riscos, mas a própria liberdade é um risco. Já estavam em ascensão, em alguns países da Europa central, partidos da extrema-direita. Começou a ser notícia generalizada depois de em maio do ano passado, a Frente Nacional ter sido o partido mais votado em França para o parlamento europeu. O semanário constantemente ridicularizava Marine Le Pen, presidente do partido e filha do primeiro dirigente do mesmo, que não tenho dúvidas, vai aproveitar este momento de fragilidade social para subir nas intenções de voto pela Frente Nacional. Este ato tornou-se portanto uma violação da liberdade de expressão e também um atentado contra os próprios terroristas e que infelizmente também se reflete naquela que é a maior comunidade islâmica a viver na Europa. Acredito que este seja um momento particularmente difícil para todos os muçulmanos residentes em França que não se revêem de modo algum no atentado ao Charlie Hebdo. Porque se há coisa que os imigrantes em Paris ou em qualquer outra parte do mundo, sejam eles de que religiões forem, podem ter a certeza é que estarão seguros enquanto houver sátiras e liberdade para as fazer como houve até agora no semanário Charlie Hebdo. Também é por isso que o semanário faz questão de mostrar que essa liberdade vai continuar com 1 milhão de exemplares nas bancas já na próxima semana. A mensagem é simples, todos têm direito à liberdade de expressão, não nos podem reprimir, e lembrem-se que a nossa liberdade é também a vossa!